quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Artigo: Tolerância zero

Giovanni Guido Cerri

Adolescência é a fase de experimentações. De descobertas, de paixões arrebatadoras, de questionamentos, insegurança e outros aspectos comportamentais típicos desta fase da vida, alguns dos quais são bastante arriscados, como sexo desprotegido e consumo de bebidas alcoólicas e outras drogas.

Socialmente aceito, o álcool está presente nas mesas de grande parte das famílias, nos bares, nas lojas de conveniência, nas baladas, shows e festas. No Brasil, mais de um milhão de pontos de venda oferecem bebidas de variados teores alcoólicos. O acesso ao álcool, no Brasil, é extremamente fácil e seu consumo, estimulado em propagandas veiculadas inclusive de manhã e à tarde, no caso da cerveja, durante partidas de futebol e outros programas.

Crianças e jovens brasileiros estão acostumados ver seus pais e familiares bebendo, são expostos à publicidade, frequentam locais onde bebidas alcoólicas estão nas prateleiras e gôndolas, veem seus ídolos de futebol e artistas favoritos consumindo álcool ou até morrendo em decorrência do abuso dessas substâncias.

Não são raros os jovens que, em decorrência de todos esses fatores , se arriscam a iniciar, cada vez mais precocemente, o consumo de bebidas alcoólicas, alguns escondidos da família e outros com o consentimento de seus pais ou responsáveis.

É extremamente preocupante, sob o ponto de vista da saúde pública, que adolescentes e crianças bebam qualquer quantidade de álcool. Este pode ser o primeiro passo para o abuso e, depois, para a dependência química, com sérios danos à saúde.

Uma pesquisa do Instituto Ibope, feita a pedido do governo do estado, apontou que 18% dos adolescentes entre 12 e 17 anos bebem regularmente, e que quatro entre dez menores compram livremente bebidas alcoólicas no comércio.

Há diversas maneiras de se coibir o uso de álcool por menores de idade. Restringir a propaganda, elevar impostos, diminuir a exposição nos pontos de venda. O Estado de São Paulo optou, dentro de sua competência legal, pela prevenção nas escolas e por uma legislação mais dura, que pune severamente estabelecimentos que vendam, ofereçam ou permitam que crianças ou adolescentes consumam bebidas alcoólicas.

O diferencial desta nova lei, que acaba de ser sancionada pelo governador Geraldo Alckmin, está justamente na palavra consumo. Antes a venda de bebida alcoólica para menores já era proibida, classificada como crime, mas se um adulto comprasse o produto e o repassasse imediatamente a um adolescente, o proprietário do estabelecimento era isento de qualquer responsabilidade.

Agora caberá aos responsáveis pelos estabelecimentos exigirem documentação e comprovar que não há ninguém com menos de 18 anos consumindo álcool no local, sob risco de ser multado, interditado e até mesmo de perder sua inscrição no cadastro de contribuintes do ICMS paulista.

Alguns hábitos e mudanças de cultura são mudados por força de leis, quando elas são seguidas de fiscalização rigorosa e de um trabalho de conscientização e educação. Foi assim no caso da obrigatoriedade do cinto de segurança e da proibição do fumo em ambientes fechados. E assim será com esta nova legislação, de tolerância zero à permissão para que crianças e jovens tenham acesso a uma substância psicoativa que pode causar dependência, doenças graves, acidentes, violência e morte.

Giovanni Guido Cerri, médico e professor da Faculdade de Medicina da USP, é secretário de Estado da Saúde de São Paulo

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