Levantamento do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, unidade da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo e referência no tratamento de HIV/Aids para a América Latina, acendeu o “sinal amarelo” entre os médicos: um em cada cinco dos adolescentes com Aids acompanhados pelo hospital abandonou o tratamento em 2012. O preconceito com a doença e a negligência dos pais são os principais motivos.
O estudo avaliou 581 adolescentes em tratamento na unidade, com idade entre 12 e 17 anos. Desse total, 131 está há pelo menos seis meses sem agendar uma consulta médica ou comparecer a um retorno. Entre eles, 71 são do sexo masculino e 60 do sexo feminino. A maioria foi infectada pela mãe durante o parto (transmissão vertical).
Segundo a médica Marinella Della Negra, infectologista do Emílio Ribas, os motivos que levam esses jovens a abandonar o tratamento estão ligados às características da adolescência. “Quando entram na adolescência, questionam por que precisam tomar o remédio mesmo quando se sentem fisicamente bem. O remédio representa a doença, por isso, não tomar é esquecer que a tem”, explica.
A rotina social e o preconceito é um desafio para diversos pacientes dessa faixa etária. A médica explica que o fato de ir ao hospital periodicamente e ter que tomar os remédios muitas vezes causa desconforto ao jovem. “Além de atrapalhar os compromissos como escola, cursos ou outras atividades, esse adolescente se sente envergonhado em explicar aos colegas e professores o porquê vai com tanta frequência ao hospital pegar remédio”, complementa.
Segundo a infectologista, o ambiente familiar contribui bastante para a não adesão ao tratamento. “Os adolescentes que seguem o tratamento normalmente são os que convivem em um ambiente familiar e social de equilíbrio, com diálogos e apoio em casa”, salienta, acrescentando que os jovens que abandonam o tratamento geralmente não estão em dia com os estudos e têm de lidar não só com o drama da doença, mas também com outros dramas familiares como alcoolismo, divórcio e agressões.
Para Robério Carneiro Jr, médico do ambulatório pediátrico do hospital, um dos principais motivos desses jovens em não aderir aos antirretrovirais é a negligência por parte da mãe. “Existem casos em que a mãe tem problema psicológico e barra o uso de remédios do adolescente. Algumas mães simplesmente não supervisionam se o filho está tomando a medicação de forma correta”, alerta.
Segundo o infectologista há também jovens que tem problemas psicológicos e não conseguem aderir e dar continuidade ao acompanhamento médico. Problemas clínicos, que geram mal estar também atrapalham. Em alguns casos, a religião desestabiliza e tira o foco do jovem do tratamento quando ele é influenciado a deixar os medicamentos por uma falsa ilusão de cura por meio da fé.
O serviço social do Instituto Emílio Ribas faz uma busca ativa pelos adolescentes que não frequentam a unidade há mais de três meses. Devido ao índice de abandono, a instituição criou um programa para acrescer e conservar a adesão dos jovens em tratamento. O projeto chama- se VIDA (Vivendo a Integração da Adesão), que tem como objetivo acompanhar o jovem durante o tempo que ele está no hospital.
Para assegurar que o adolescente cumpra toda a sua rotina médica e trabalhe o seu lado psicológico e social, o programa estabelece um canal com o jovem por meio de uma sala multidisciplinar, equipada com computadores, livros, cartilhas e o jogo de tabuleiro ‘Vida’, idealizado por jovens em tratamento, que faz uma alusão à vida de uma pessoa com HIV. A atividade consiste em mostrar que a cada etapa cumprida do tratamento, o jogador avança casas e conquista novos valores, inclusive qualidade de vida.
O voluntariado do hospital também participa ativamente com o Programa de Adesão Poder Jovem Institucional, que visa integrar jovens e estabelecer a oportunidade de trocar experiências e dividir suas dúvidas e angústias, seja por vergonha ou medo. O projeto auxilia a descoberta de características individuais e potenciais de cada paciente para solucionar desafios do dia a dia e mostrar a esse jovem que ele pode ter uma vida como a de qualquer outro adolescente na sua idade.
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